A semana trouxe dois fatos imensamente importantes, talvez os mais significativos para o interesse público, e ambos são muito animadores. Trouxe também uma notícia já previsível, e muito preocupante.
Já ganhou destaque nos noticiários o anúncio de que os testes de vacinas contra a Covid-19 desenvolvidas por mais de um laboratório mostraram eficácia superior a 90 por cento. Um laboratório informou eficácia de 95 %, outro de 94 %. Como também outros laboratórios se empenham em fases finais de testes, é de se supor que haverá vacinas suficientes para atender à toda demanda mundial. Haverá a natural dificuldade de implementação da vacinação, e esta será construída ao longo do primeiro semestre de 2021.
O segundo fato muito significativo vem de La Jolla, no estado norte-americano da California, onde o Instituto de Imunologia local tem se somado a outras instituições similares cujas pesquisas recentemente vêm apontando otimismo em relação à duração da imunidade desenvolvida ou adquirida contra o novo corona vírus. O Instituto de La Jolla já mensurou 8 meses de imunidade nas pesquisas que realizou e segundo seus virologistas projeta-se um alcance de imunidade que pode chegar a um ou mais anos.
Mais dados deverão ser apurados e comprovados, e a Covid-19 já demonstrou experiências muito diversificadas entre pacientes, em que o que vale para um não vale necessariamente para outros. De qualquer forma, o dado de La Jolla não deixa de ser um bom presságio.
O terceiro fato significativo é que, na contramão dessa contagem regressiva até a vacinação, a população não se ajuda, e muitos poderão “morrer na praia”, por “abandonar o navio ainda em alto mar”. O “navio” é o esforço de proteção por máscaras e distanciamento social, que há um mês já foi abandonado por milhares que se amontoaram em praias, bares, restaurantes, etc, por já estarem “cansados” da quarentena. Hoje, no Rio de Janeiro, São Paulo, e outras cidades brasileiras, os hospitais estão próximos a um colapso com o aumento das internações por Covid-19. Não foi por falta de aviso, mas para muitos a ignorância fala mais alto do que a sabedoria.
Enquanto isso, vivemos ainda um momento eleitoral, e cabe tratar desse assunto até porque depois muitos não vão mais querer saber, “cansados” que estarão diante de temas políticos, uma lástima a revelar a alienação social dessas pessoas.
No domingo da próxima semana novamente o país estará mobilizado eleitoralmente, para as definições de segundo turno nos municípios em que nenhum candidato alcançou maioria simples de votos. Estas cidades terão novamente o trabalho e a tensão característicos de um dia assim, e tudo em plena situação de pandemia. Me ponho a refletir sobre o que poderia ser melhorado para o futuro.
É inevitável tecer alguma comparação com as eleições nos EUA. Mesmo com as diferenças históricas abissais entre os dois países, acredito que algumas lições poderiam ser mutuamente tiradas.
Aqui no Brasil não temos o famigerado colégio eleitoral, que define o Presidente da República de forma indireta, e que ultimamente na prática só tem ajudado candidatos de um partido, que pode vencer mesmo com milhões de votos a menos. Nesse aspecto, estamos à frente. Nosso processo de votação também é mais ágil, com apuração mais rápida proporcionada pelo uso de urnas eletrônicas. Talvez os norte-americanos devessem nos copiar aí, se quisessem ou precisassem.
Param por aí nossas vantagens. Considero vergonhoso que, em meio à maior crise de saúde pública da nossa história contemporânea, não tenhamos opções de voto não-presencial, obrigando-se eleitores e eleitoras em grupos de risco a se sujeitarem à aproximação social abdicando de sua proteção contra a devastadora pandemia que nos aflige. Nos EUA, mais de 100 milhões votaram por correio, livres de qualquer risco.
Aqui, já chamei atenção anteriormente, somos obrigados a votar, e se alguém não quiser se arriscar terá que justificar por que não compareceu à urna, ou arcar com multa e consequências na sua liberdade profissional. Nos EUA, voto não é obrigatório, é um direito e não obrigação. Com a opção de votar antes e pelo correio, os mesmos mais de cem milhões tiveram garantido seu precioso direito ao voto. Já aqui, só o que se pode fazer é justificar o NÃO-voto. Em simples palavras, é uma pouca vergonha.
Tinha levantado anteriormente a sugestão de que eleições passem a acontecer digitalmente por aplicativo. O TSE parece ter percebido essa possibilidade, acenando a empresas de informática para uma futura licitação. Clubes de futebol já dão o exemplo, com Corinthians, Santos e São Paulo anunciando votação por aplicativo para seus próximos dirigentes.
Claro que consolidando-se um sistema assim, teria-se que paralelamente desenvolver “vacinas” contra tentativas de fraudes que irão acontecer, com a utilização de criptografia, heurística e demais recursos que visam a proteger dados confidenciais.
Não paremos por aí. Há outros aspectos que talvez nós no Brasil também devêssemos copiar dos norte-americanos. Um deles seria a implementação de normas mais sólidas na definição de partidos políticos, para que estes fizessem mais jus à sua finalidade. Do jeito que as coisas são, não passam de legendas, nomenclaturas rasas a meramente cumprir protocolos burocráticos eleitorais. Não é à toa que vivemos às voltas com atividades corruptas e candidatos usando as legendas para objetivos próprios em vez de se comprometer com propostas de interesse da população.
Quanto a ser presidencialista, parlamentarista, ou monarquista, entendo que o que faz diferença é a estruturação das instituições político-partidárias no melhor atendimento à democracia. EUA e França são presidencialistas, enquanto vários outros países desenvolvidos são parlamentaristas inclusive a Grã-Bretanha onde a monarquia é apenas uma tradição formal que muitos gostam de acalentar. Claro que são exemplos de países do chamado “primeiro mundo”, os mais civilizados. Em países menos civilizados, me inclino por pensar que seria melhor o parlamentarismo, por ser uma solução político-administrativa mais técnica, menos suscetível a manipulações amparadas em apelo pessoal de candidatos. Conhecendo nossa Latino-América, acho difícil que aconteça.
Outro aspecto: plebiscitos pontuais por estado, embutidos na eleição, abordando questões locais. Seria uma solução bem prática sem implicar em todo o esforço de um único plebiscito em si. Será que o Brasil não mereceria ser mais federativo do que é, até por sua dimensão continental? Em diferentes regiões temos questões específicas de interesse. Enquanto não houver maior autonomia dos estados, estes seguirão sua rotina de implorar ao governo federal e depender dele para que os ajude aqui e ali. Deveríamos desenvolver vacina também contra isso.
Publicado no jornal O Progresso – Montenegro RS
Por: Augusto Licks
Jornalista e músico. Como jornalista, foi editor de rádio e TV em Porto Alegre, colunista de O Estado de São Paulo Online, e atualmente colabora com o jornal O Progresso de sua cidade natal, Montenegro/RS. Como músico foi o guitarrista da fase de sucesso dos Engenheiros do Hawaii, manteve uma importante parceria com o cantor e compositor Nei Lisboa, é autor de trilhas para cinema e teatro, além produtor musical. Apresentou-se em centenas de shows no Brasil, incluindo eventos como Rock In Rio e Hollywood Rock, e em países, como Rússia, Japão e Estados Unidos.
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Interessante a análise do Augusto Licks. Aprecio a leitura !