Ao Pé da Letra — Augusto Licks

Disparates são afirmações sem sentido, feitas para gerar impacto e repercussão, especialmente em cenários eleitorais. Salvo exceções, não geram consequências penais. O general Carlos Alberto Santos Cruz, ex-ministro do atual governo, afirmou à revista Veja que a gestão do presidente Jair Bolsonaro se tornou um “PT verde-amarelo” e que isso seria um reflexo do “comunismo de direita no Brasil”.

Disse que há um culto à personalidade de Bolsonaro, cujos seguidores o chamam de “mito” e “designado por Deus”, e que isso é uma técnica consagrada por sistemas totalitários, ao contrário da democracia.

Claro que “comunismo de direita” não faz sentido, e nem faria sentido dizer “socialismo de direita”, seria misturar ideologia econômica com ideologia política incompatível. Laranjas com maçãs, como se diz.

Teria a Alemanha de Hitler sido socialista ? Ué, a ideologia era o “nacional-socialismo”, termo que foi abreviado como “nazismo”, inspirado no fascismo italiano de Mussolini. Nomeclaturas não guardam compromisso com propostas políticas, vide candidaturas pelo Partido Comunista do Brasil e similares, alguém realmente acredita que se proponham a implantar “comunismo” ou coisa parecida ? E o antigo PSD e similares, teriam realmente o propósito de implantar social-democracia no país ? São meras siglas, a cumprir utilidade burocrática eleitoral.

Espalha-se que criminalidade é exclusiva de uma ou de outra ideologia. É o tal “nós somos os bons, eles são os maus”. A contrapor isso, outro dissidente bolsonarista, o senador Major Olimpio estampou o que não é disparate: “Ladrão de direita é igual ladrão de esquerda. Simplesmente ladrão”. Referia-se ao colega Flávio Bolsonaro, que o Ministério Público acusa de ter desviado parte do salário de seus assessores na época em que era deputado estadual.

Outro disparate: nosso vice-presidente declarou que não existe racismo no Brasil. Seria uma orientação interna do governo negar o que é inegável diante dos fatos ? A Fundação Palmares, aliás, já tem sido destituída de seus objetivos originais.

Mourão testemunhou que nos EUA passageiros de ônibus eram separados por raça. Confundiu as coisas, pois o “busing” era consequência. Há racismo tanto nos EUA como no Brasil, a diferença é que lá houve segregação e aqui houve miscigenação.

O feriado nacional da Consciência Negra, 20 de novembro, existe entre outras coisas para nos fazer lembrar que uma raça foi escravizada em nosso país, que este foi um dos últimos a abolir esse mal, e que essa raça continua sofrendo preconceito e discriminação social e profissional. Não adianta maquiar com frases falsas do tipo “isso é coisa de quem quer dividir nosso povo”, ou que “nos EUA os brancos sofrem racismo”. Ora, não foram os brancos que foram escravizados e sofrem consequências disso, simples assim.

Datas existem para destacar questões específicas e concretas. Poderíamos, por exemplo, ciar uma data alusiva ao fim da pandemia, quando isso acontecer, para que nunca nos esqueçamos do horror que estamos vivendo. Nem ela, porém, escapa a disparates. O presidente Bolsonaro já disse que precisamos parar de ser “maricas”. Sobre o auxílio emergencial, disparou um “-Pergunte ao vírus”. Antes, culpou estados e municípios pelo abandono de milhões de testes de Covid armazenados pelo seu Ministério da Saúde.

Por que disparates assim são ditos ? Simples: porque tem gente que acredita neles, retrato da ignorância que nos assola, um mal para o qual o único remédio seria a educação. Temos então esse vale-tudo a nos desorientar. Quem vai conferir se é verdade, a não ser os meios de comunicação, mas você assiste a estes ? Ou se contenta com mensagens que chegam por celular ? É bom refletir sobre isso, não adianta reclamar depois.

Reproduzo então aqui algo que não é disparate nenhum, e sim um apelo feito em vídeo por médicos(as) e enfermeiros(as) dos Estados Unidos, implorando à população para que faça sua parte. Exemplo que nossos profissionais de saúde deveriam seguir :

Você nos chamou de heróis …

mas heróis não merecem isso.

Lutamos duramente para proteger nossas comunidades.

Mês

após

mês

Nossos escudos estão gastos.

Nossa determinação está sendo testada.

Ainda assim, continuamos na pressão

porque realmente queremos ver o fim desta pandemia.

Colocamos nossas vidas em risco diariamente pela sua segurança.

Então, faça algo por nós. Vista uma máscara.

Façamos isso, ao pé da letra.

P.S.: Deixou-nos Diego Armando Maradona. Não era Deus, mas no universo do esporte mais popular do planeta, era como se fosse. A genialidade extraordinária na sua arte-ofício e seu forte carisma pessoal a contrastar com as dificuldades em sua vida particular são demonstração cabal de que a existência humana é movida em grande parte por contradições, não apenas idealizações. Que descanse em paz, nós que amamos o futebol lhe somos eternamente gratos.

Publicado no jornal O Progresso – Montenegro RS

Por: Augusto Licks
Jornalista e músico. Como jornalista, foi editor de rádio e TV em Porto Alegre, colunista de O Estado de São Paulo Online, e atualmente colabora com o jornal O Progresso de sua cidade natal, Montenegro/RS. Como músico foi o guitarrista da fase de sucesso dos Engenheiros do Hawaii, manteve uma importante parceria com o cantor e compositor Nei Lisboa, é autor de trilhas para cinema e teatro, além produtor musical. Apresentou-se em centenas de shows no Brasil, incluindo eventos como Rock In Rio e Hollywood Rock, e em países, como Rússia, Japão e Estados Unidos.

Foto: Divulgação

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